Marrakesh – Esse papo já tá qualquer coisa, você já tá pra lá de Marrakesh
Marrakesh
Chegar em Marrakesh não foi fácil. Além de ter que acordar de madrugada, ficar umas 12 horas no vôo até Casablanca, a minha conexão para Marrakesh atrasou.
Depois de uma certa bagunça e falta de informação, nos enfiaram num avião para Marrakesh a 1 da manhã. Cheguei em Marrakesh e cadê minha mala? Nada de mala. Até registrar que perderam minha mala e pegar um táxi, cheguei no hostel 3 da manhã. Capotei e acordei só lá pras 2 da tarde e fui direto para a praça principal comer alguma coisa.
Djemaa El Fna é a praça principal de Marrakesh e é considerada patrimônio mundial da humanidade pela Unesco. Com razão. Quando estava caminhando pela entrada principal da praça, passando pelas carruagens e ouvindo ao fundo os sons dos músicos, dos encantadores de cobras e do burburinho da praça, o coração bateu mais forte.
Naquela hora caiu a ficha de que eu realmente estava num país com uma cultura completamente diferente da nossa. A cada passo o barulho aumentava e dei de cara com encantadores de serpentes, uns caras com macacos a tiracolo, mulheres com os véus típicos do Islã e homens também com as roupas típicas. Vendedores de suco de laranja berrando, bancas de frutas, tudo isso sob o escaldante sol marroquino.
Rodei pela praça, tomei um suco de laranja e achei um lugar pra comer um cuzcuz marroquino, que no Marrocos é só cuzcuz. Depois de comer o cuzcuz (que nem de longe virou minha comida favorita do Marrocos) fui dar um rolê pelos famosos Souks.
Os souks são muitas ruelas com pequenas lojas, uma do lado da outra, que vendem todo tipo de coisa. Tecidos, cerâmicas, roupas, comidas, doces, lustres, tapetes, jóias, só não vendem a mãe porque ela tá na loja do lado vendendo alguma coisa pra alguém.
Os souks em Marrakesh são gigantes, ruelas que se cruzam para todos os lados e que se parecem. Um verdadeiro labirinto.
Parei para comer um doce numa banca, quando um cara começa a puxar papo. Aquela conversa: daonde você é? Ah, do Brasil que legal, mas você tem cara de marroquino (isso até que é verdade pois mais de uma vez chegou alguém falando árabe comigo enquanto os outros gringos já tinham um carimbo de turista na testa) enfim, nessa conversa eu entendi que os Berberes, o povo marroquino que vive no deserto estava acampado numa praça a frente e que eles faziam vários produtos interessantes e faziam demonstrações com os camelos e tudo aquilo que um ocidental espera ver num povo que vive no deserto.
No que eu falei pro cara que queria ir lá, ele pega um cara passando e fala que aquele cara sabia onde era o lugar. Pronto, fui engambelado!
Fui andando com o cara e ele falando que a família da mulher era berbere e tal e que ele trabalhava num Tannerie, os curtumes de Marrakesh. Opa! Eu já tinha ouvido falar disso, os curtumes em Marrakesh ainda utilizam técnicas milenares para tratar o couro e essas técnicas até hoje não envolvem melhorias nas condições de trabalho e muito menos o cheiro horrível dos curtumes.
Pois antes que eu conseguisse dizer que era um engano que eu queria era ver os Bérberes e não um curtume, lá tava eu dentro de um. Daí em diante apertei o foda-se e segui em frente.
A primeira coisa que o tal guia do curtume me dá é um punhado de hortelã pra cheirar e tentar mascarar o futum de carne podre e bosta de pombo. Sim meus amigos, eles usam bosta de pombo curtida como amoníaco natural. Sim, é nojento e fedido demais.
Depois me mostrou os processos com o couro e como é amaciado na mão. Aliás todo o processo é manual e as condições dos trabalhadores são realmente lastimáveis. Após o tour fedido ele me levou para a loja com os artigos de couro.
E lá de novo o vendedor não calava a boca nem pra respirar me mostrando sapatos, pufes, carteiras, bolsas, tudo feito de couro. Realmente a qualidade dos produtos, ainda mais feitos a mão são excelentes, mas a questão é que eu não ia comprar nada.
Ao final quando o vendedor ficou esperando eu sacar a dinherama do bolso e comprar uma cueca de couro, só fiz uma cara de coitado, disse que não tinha como levar nada daquilo embora e só pude dizer sorry man! Quase fui chutado da loja tamanha a cara de merda do vendedor.
Quando saio tá lá o guia do tour fedido. Chega e me pede 100 dirams! O que daria 10 euros. Dei 10 dirhams e saí fora dessa roubada. Pior foi ir embora, eu lá no meio daqueles souks, perdidão, daí do nada aparece um moleque pra me “ajudar”.
Saquei na hora que ia precisar desembolsar mais alguns trocados pra aquele moleque me tirar dali mas pra quem tava perdido mais 10 dirhams faz parte.
Bom, se de dia a praça já é fantástica, a noite ela fica espetacular. Além dos que ficam de dia, a praça é tomada por todo tipo de caras a fim de ganhar um trocado.
Tem contadores de histórias, músicos de todos os tipos, dançarinos, jogo de apostas, tatuadoras de henna, ciganas lendo a mão, e até um grupo que se veste de mulher, sendo um país muçulmano é um pouco estranho que se permita esse tipo de show.
Além disso a noite abrem todas as bancas de comida na praça: é banca de scargot, de doces, com cabeça de porco assada, com vários tipos de comidas e todas garfando os incautos no meio da rua.
Eu tava louco pra provar outra comida marroquina então depois de dar uma rodada pela praça, decidi ir na banca de um gordinho simpático. Fiz bem. Provei um Tajine, sugerido por uma turista marroquina que estava jantando. E vou falar pra vocês, é uma delícia.
Aliás a comida marroquina é maravilhosa. Provei Tajine, kebab de carneiro (espetinho), o cuzcuz, as saladas com berinjela assada, tudo maravilhoso.
A falta da minha mala me fez desistir de ir ao deserto. Como eu ia pro deserto se eu só tinha 2 mudas de roupas? De dia usava uma, lavava e usava a outra enquanto secava.
Liguei pra companhia aérea e não resolveu. Decidi ir até o aeroporto e fiquei lá falando com o responsável que disse que a mala tava sendo rastreada e que me avisaria quando chegasse. Não botei muita fé.
E eu tinha razão pois minha mala nunca chegou e mesmo após meus protestos e tentar falar com Deus e o mundo a verdade é que eles não tão nem aí. Royal Air Marroc é a pior companhia aérea do mundo. Anotem esse nome para nunca usarem.
Medersa Ben Yousef, Palácio Bahia, Palácio Badii, Museu de Marrakesh
Nos dias seguintes resolvi visitar os palácios de Marrakesh. Sim, os palácios dos Sultões. Vi desde o palácio Badii que está em ruínas até um mais recente, o palácio Bahia que ainda está maravilhoso por ser bem mais recente.
Visitei também o Medersa Ben Yousef o antigo colégio muçulmano de arquitetura fantástica e o museu de Marrakesh reformado a pouco tempo e que é uma verdadeira pérola.
Toda noite eu ia jantar na praça para provar as delícias do Marrocos e um dia foi mais interessante. Sentou do meu lado duas gordas, que pareciam que estavam sem comer fazia uns 15 dias, tamanha a velocidade com que elas devoravam os pratos e ainda reclamavam com os atendentes pedindo mais pão e reclamando do tamanho das porções.
Vi que elas tavam tentando tirar um selfie, me ofereci pra tirar a foto e aproveitei pra conversar um pouco com elas. Elas eram de Casablanca no Marrocos mesmo e estavam lá a turismo.
Como elas estavam com o cabelo pintado e maquiadas e sem véu, perguntei se elas eram muçulmanas, no que elas disseram que sim, que no Marrocos elas tem mais liberdade.
É na Árabia Saudita que as mulheres são obrigadas a usar a Nihab, que cobre todo o corpo e só deixa os olhos de fora. No Marrocos as mulheres usam os véus se quiserem.
Depois de saber tudo isso pensei em sugerir a elas uma suruba marroquina-brasileira já que o Marrocos é tão liberal, mas me dei conta que não daria conta das gordas.
O pouco de contato que tive com o povo marroquino pude sentir como eles são um povo bacana.
Os vendedores apesar do típico trato pra agradar por querer vender, são muito amáveis, e uma coisa engraçada, conhecem a Ana Maria Braga!
Mais de uma vez andando pelas barracas de comida um deles me pergunta daonde eu sou e ao saberem que sou brasileiro ao invés de falar do Ronaldinho falaram: Ana Maria Braga! Até aqui essa praga chegou!
Eu acabei voltando a mesma banca do gordinho para jantar umas 3 vezes e cada vez era recebido ainda melhor. Um outro exemplo foi quando fui uma segunda vez no aeroporto pra saber da minha mala.
Fui pro lado errado, olhei no gps e achei que da onde eu estava daria para ir até o aeroporto a pé. Até dava, só que era longe pra cacete e o sol tava rachando o côco.
O caminho era uma avenida gigante que mais parecia uma estrada, completamente deserta de pedestres, pois só o trouxa aqui resolveu ir a pé. E não foi que no meio dessa estrada vinha um guardinha numa mobilete e vendo o trouxa resolveu me dar uma carona?
Perguntei pra ele se ia pro aeroporto e ele confirmou com a cabeça e lá fui eu na garupa da mobilete até o aeroporto. Me deixou lá e seguiu o seu caminho.
Nos outros dias explorei a cidade, andei pra tudo quanto foi lado de dia e de noite. Os souks a noite são ainda mais interessantes pois com as lojas todas iluminadas principalmente as lojas de lustres dava um destaque todo especial as ruelas.
Por fim tive que dar adeus a Marrakesh e seguir o meu caminho rumo a Lisboa, sem mala, sem roupa e sem suruba com gorda faminta.
Próxima parada: Lisboa